Resenha “A Morte de Ivan Ilitch”, Liev Tolstói

Ivan Ilitch

Resenha “A Morte de Ivan Ilitch”, Liev Tolstói

Foto: Reprodução/Editora 34

“Hoje que apenas sou matéria e entulho / Tenho consciência de que nada sou”, é um trecho do poema ‘Vozes de um túmulo’ do poeta paraibano Augusto dos Anjos que ilustra o que encontramos na obra de Liev Tolstói. Citar um poeta nordestino em um texto sobre literatura russa parece desconexo, mas em “A Morte de Ivan Ilitch”, os temas se abraçam, e não há mistério do que está por vir, já que o próprio título faz questão de deixar claro. Tolstói convida o leitor a imergir na mais temerosa parte das nossas vidas: o fim dela.

Apesar de ser lançado em 1886, a obra é atemporal e em breves páginas traduz o sentimento que nunca deixará de existir em todas as facetas da espécie humana, o medo da morte e o que ela deixa para os vivos é presente em religiões, correntes filosóficas, ciências e até mesmo em rodas de conversas entre amigos, afinal de contas, nesse mundo a morte é a única certeza que sempre temos. O livro, como já esperamos, se inicia com o anúncio do falecimento de Ivan Ilitch, funcionário de um órgão público com cargo prestigiado.

Logo no início já nos deparamos com a superficialidade do tema mortuário. Quando os funcionários descobrem a morte de Ivan Ilitch, começa a se discutir sobre quem ocupará seu cargo. Ainda que haja comoção sobre o falecimento do indivíduo, para todos o sentimento mais gritante é sobre si mesmo, sobre suas expectativas de ocupar o que o morto até então ocupava. A morte para quem morreu é um ponto final, mas para os viventes é um novo capítulo de possibilidades esperando para serem escritas.

Após acompanharmos o ponto de vista dos vivos, tanto do trabalho quanto do ambiente familiar, enfim conhecemos Ivan Ilitch, acompanhamos seus passos de vida, conhecemos os sentimentos, angústias e sonhos do personagem, até o momento em que uma doença se apossa de sua vida. E eis aqui a parte mais brutal de ler este livro, a cada novo capítulo, morremos com o personagem.

É quando olhamos para nossas fragilidades que percebemos que no final das contas tudo que somos apenas meros humanos. Ivan Ilitch não é muito diferente de qualquer ser humano comum, ainda que com características e peculiaridades individuais que nos diferem, é impossível não se identificar com o personagem e projetar nesse nossas próprias experiências.

Não é revelado exatamente qual a doença que aflige o personagem, mas acompanhamos detalhadamente cada processo de sofrimento, da luta pela vida, das crises existências, e das dores físicas e emocionais de Ivan Ilitch. No processo de morrer junto com o personagem, questionamos se estamos vivendo ou sobrevivendo, se somos quem realmente queremos ser ou se nos deixamos ser vítimas de máscaras sociais.

Tolstói nos entrega um clássico eterno e verossímil, a morte que finda o personagem, ao leitor pode deixar um sentimento de convite para a vida. São diversos os pensamentos e reflexões que podem ser extraídos, mas, em minha forma mais honesta e sentimental, te digo leitor: que belo presente é estar vivo!

Escritor Liev Tolstói (Foto: Reprodução)

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